domingo, 15 de fevereiro de 2009

Acessibilidade e cidadania - pelo direito de votar.

Nesta última semana, foi divulgada nas listas virtuais do Movimento Nacional de Inclusão Social da pessoa com deficiência a seguinte informação: que foi publicado pelo Jornal Virtual Diário Comércio Indústria e Serviços (DCI) que a primeira proposta de emenda à Constituição (PEC) apresentada em 2009 (de autoria do Senador Mozarildo Cavalcanti, do PTB-RR), sugere que pessoas com deficiência que tenham dificuldade de locomoção passem a ter direito de decidir pelo exercício ou não do voto em cada eleição.

A PEC n.º 1/09 afronta indiretamente não somente a Constituição Federal, que estabelece a obrigatoriedade do alistamento eleitoral e do voto para TODAS as pessoas maiores de 18 anos (facultando o exercício desses direitos apenas aos analfabetos, aos maiores de 70 anos e às pessoas que tenham entre 16 e 18 anos), mas também ofendendo diretamente a Novel Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência, tratado internacional com força de emenda constitucional, ratificado pelo Brasil em 10.06.2008, e que prevê como um dos seus pilares a capacidade legal assistida da pessoa com deficiência, em hipótese alguma a usurpação de sua autonomia.

Primeira convenção internacional do século XXI, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi homologada pela Assembléia das Organizações das Nações Unidas em 13 de dezembro de 2006, em vigor desde 3 de maio de 2008 (com a vigésima ratificação). No Brasil, que já era signatário da Convenção e do Protocolo desde 30 de março de 2007, foi ratificada por meio do Decreto Legislativo n.º 186, de 10.06.2008, com status de Emenda Constitucional.

Diz a Convenção que caso a pessoa com deficiência necessite de ajuda para exercer sua cidadania, esta deve ser prestada, sim. No entanto, que não se confunda a necessidade de ajuda com incapacidade para o exercício dos atos da vida civil, com usurpação de sua cidadania ou aviltamento de sua dignidade.

A Convenção valoriza sobremaneira a autonomia, a autodeterminação e a capacidade legal assistida das pessoas com deficiência, preocupando-se em garantir os meios para que lhe seja possível o exercício da cidadania sem percalços, com a supressão de barreiras arquitetônicas, de comunicação e atitudinais para que possa haver um pleno acesso a bens, serviços e direitos.

Uma outra novidade é que ela considera responsável pela falta de acessibilidade e das condições necessárias ao exercício da cidadania pela pessoa com deficiência a própria sociedade, por meio da escolha de seus dirigentes, e por silenciarem perante a não adoção de medidas que proporcionem a plena inclusão.

Não seria diferente com a questão eleitoral. Não promover acessibilidade nos locais de votação consiste em proibir, por linhas transversas, as pessoas com mobilidade reduzida de votarem, escolhendo seus dirigentes e representantes.

Muito embora a PEC preveja que as pessoas com deficiência que tenham dificuldade de votar em razão da idade e da escolaridade é que irão julgar se as barreiras para o exercício de seu direito de votar são de tal monta que não podem ser superados, sabemos que este é um retrocesso no exercício da cidadania por parte das pessoas com deficiência. No final das contas, tal projeto só contribui para que mais se protele a adoção de soluções em acessibilidade.

Pelo teor da PEC, detalhes, como a definição precisa de quais dificuldades de locomoção serão relevantes, devem ficar a cargo de legislação ordinária ou de regulamentação a ser produzida pela Justiça Eleitoral. Isso em muito preocupa o Movimento de Inclusão Social da Pessoa com Deficiência. A se utilizar como exemplo a regulamentação da importante Lei n.º 7.853/89 (que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência -Corde, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras providências), cujo decreto regulamentador só veio em 20.12.99 (Decreto n.º 3.298/99), o que se receia é que anos se passem com essa matéria sem regulamentação. E enquanto isso, por certo, o Poder Público continuará se omitindo a proporcionar acessibilidade nos locais de votação.

Infelizmente, a PEC só contribui para delongar a obrigatoriedade que recai sobre o próprio poder público em promover acessibilidade.

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