quarta-feira, 29 de novembro de 2006

Artigo: Pessoas com deficiência - "embaixo do sol", o que há nas leis que lhes garanta a dignidade e o respeito aos direitos humanos.


PESSOAS COM DEFICIÊNCIA:
"Embaixo do sol", o que há nas leis
que lhes garanta a dignidade e o respeito aos direitos humanos

Primeiramente, muito embora o termo pessoa portadora de deficiência (bem como a respectiva sigla – PPD), esteja presente em quase todos os nossos instrumentos jurídicos, inclusive a Constituição Federal, deve ser evitado.

Os estudiosos das questões afeitas às pessoas com deficiência orientam para que se denomine, apenas, “pessoa com deficiência”. Esclarecem que “portar” seria expressão equivocada. Que se “porta” bolsa, celular, carteira, ou outro acessório que se faz possível retirar, ao sabor da vontade do portador. Com a deficiência, isso não é possível, o que torna o termo impróprio.

O Brasil é um dos países mais avançados no que respeita a legislação relativa à pessoa com deficiência.

Destaquemos, primeiramente, os dispositivos contidos na Constituição Federal de 1988, que lhes confere ampla proteção (art. 1º, IV; art. 3º, III e IV; art. 5º; art. 7º, XXXI; art. 37, VIII; art. 170, VII e VIII; art. 203, IV e V; art. 208, III; art. 215; art. 217, §3º; art. 227, §1º, II; art. 244).

Há mais de 25 anos vem sendo intensamente discutida, perante organismos internacionais como a ONU – Organização das Nações Unidas – e a OIT – Organização Internacional do Trabalho – as questões relativas à inclusão social da pessoa com deficiência.

A Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1948, já se preocupavam com a questão da igualdade para todos indistintamente. É claro que são instrumentos aplicáveis às pessoas com deficiência. Mas o ano de 1981, proclamado pelas Nações Unidas como o “Ano Internacional das Pessoas Deficientes”, abre uma fase de intensas discussões internacionais acerca das condições de vida, acessibilidade e inserção no mercado de trabalho dessas pessoas.

Destaquemos as Resoluções 37/52 e 37/53, de 3 de dezembro de 1982, da Assembléia Geral da ONU, cujos propósitos foram os de promover, respectivamente, o programa de Ação Mundial para Pessoas com Deficiência e a proclamação da Década das Nações Unidas para as Pessoas com Deficiência.

No mundo moderno há um número expressivo de pessoas com deficiência, devido as mais diversas causa, entre elas as guerras, as doenças, a violência, a pobreza, os acidentes etc.

A cifra estimada é de que são 600 milhões de pessoas com deficiência em todo o mundo. Na maioria dos países, pelo menos uma em cada dez pessoas tem uma deficiência física, mental ou sensorial. Estima-se que no mínimo 350 milhões de pessoas deficientes vivam em zonas que não dispõem dos serviços necessários para ajudá-las a superar as suas limitações.

No Brasil, segundo a ONU, 10% (dez por cento) da população possui algum tipo de deficiência. Em nosso País, o Censo 2000 assentou que 14,5% da população possui algum tipo de deficiência, o que corresponde a 24,5 milhões de pessoas (mais precisamente, 24.537.984 PPD’s), das quais 15,14 milhões têm idade e condições de integrarem o mercado formal do trabalho. De acordo com dados divulgados pela OIT, o desemprego entre as pessoas com deficiência com idade para trabalhar é extremamente maior do que para as pessoas ditas “normais”, podendo chegar a 80% em alguns países em desenvolvimento.

Sensível a essa problemática, o Brasil, como no resto do mundo, ante o crescente desemprego, com conseqüências mais graves ainda, quando se trata de pessoas com deficiência ou trabalhadores reabilitados, que via de regra necessitam de condições especiais para o desempenho satisfatório de suas funções, cuidou, através de lei, de estabelecer “reserva de mercado” em seu benefício, consignando no art. 93, da Lei n.º 8.213/91 (Plano de Benefícios da Previdência Social) que:

A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) de seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência habilitadas na seguinte proporção:
I - até 200 empregados 2%
II - de 201 a 500 empregados 3%
III - de 501 a 1000 empregados 4%
IV - de 1001 em diante 5%

Tal dispositivo, com esta sinalização, em boa hora veio abraçar as pessoas com limitações físicas, mentais ou sensoriais, habilitadas e aptas para o labor, garantindo para as mesmas - como garante o nosso ordenamento jurídico para qualquer cidadão - o direito social ao trabalho.

Infelizmente, o mandamento permaneceu adormecido e apenas a partir de 1999 passamos a perceber as primeiras movimentações no sentido de lhe dar cumprimento efetivo. É que somente ao final de 1999 a questão da inserção ficou melhor esclarecida, com a edição do Decreto n.º 3.298, de 20/12/99, que dedicou sua Seção IV para tratar justamente do acesso das pessoas com deficiência ao mercado de trabalho. Em seu art. 36, o mencionado decreto reiterou o já contido na Lei n.º 8.213/91 e expôs com mais precisão a questão da inserção.

De forma inovadora, o decreto estabeleceu em seu art. 36, § 1º, que a pessoa com deficiência contratada só poderá ser dispensada após a contratação de substituto em condições semelhantes. Com isso não buscou proporcionar estabilidade a essas pessoas em seus cargos, mas a reserva da vaga, do posto de trabalho conquistado, obstando qualquer intenção de empregadores menos escrupulosos de efetuarem um cumprimento inicial da lei, para mostrarem adaptação aos órgãos fiscalizadores, e num momento posterior gradativamente eliminarem essas pessoas de seus quadros.

Também é de se destacar a Instrução Normativa n.º 20/2001, do Ministério do Trabalho e Emprego, que dispõe sobre os procedimentos a serem adotados pelos Auditores Fiscais do Trabalho, quando da fiscalização do trabalho das pessoas com deficiência nas empresas. Determina que não pode ser considerado relação de trabalho a ser abatida na cota legal, em nenhuma hipótese, o trabalho realizado por pessoas com deficiência em oficinas terapêuticas e, quando ausentes os requisitos caracterizadores de vínculo empregatício nos moldes celetistas (art. 3º, CLT), o trabalho realizado em oficinas de produção.

E também não é de se considerar parte da cota a que a empresa se encontra obrigada, as pessoas contratadas por meio de terceirização. Nesse caso, as pessoas com deficiência podem muito bem ter o número abatido do percentual a que estejam obrigadas as empresas prestadoras de serviços que possua mais de 100 empregados, mas nunca da tomadora dos serviços, uma vez que não compõem seus quadros e não são seus efetivos empregados.

Outra importante questão tratada na mencionada Instrução Normativa é de que o percentual a ser aplicado, previsto na legislação, deverá incidir sobre o número total de trabalhadores do empreendimento, quando se tratar de empresa com mais de um estabelecimento. Isto é de fundamental importância, pois aplicado o percentual da lei sobre o número de empregados de cada estabelecimento, individualmente, se encontra número muito aquém do que se alcançaria se considerado o grupo econômico.

Atualmente, o Ministério Público do Trabalho o Ministério Público Federal, o Ministério do Trabalho e Emprego e o Ministério da Justiça, dispõem de coordenadorias, conselhos ou setores específicos para tratar das questões relativas às pessoas com deficiência, tamanho o despertar para a causa.

Diversas unidades da federação criaram núcleos de trabalho, compostos dos mais diversos órgãos e entidades comprometidas com a inclusão social da pessoa com deficiência (Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Estadual, Ministério do Trabalho e Emprego, Instituto Nacional da Seguridade Social, Secretarias Estadual e Municipal de Assistência Social, de Educação e da Saúde, SINE, entidades do sistema “S”, associações representativas das pessoas portadoras de deficiência, as próprias pessoas da comunidade etc.). Atualmente, os mencionados Núcleos de Combate a Discriminação nas Oportunidades de Trabalho estão sob a direção do Ministério do Trabalho e Emprego, porque é ele quem coordena, também, o Programa Brasil Gênero e Raça, que foi o programa de governo que exigiu a criação desses grupos estaduais de discussão e combate às mais diversas formas de discriminação (negros, índios, idosos, mulheres, homossexuais etc.).

Todo Estado possui, então, seu núcleo de trabalho que funciona sob a coordenação da Delegacia Regional do Trabalho. Estados maiores mantêm mais de um núcleo, funcionando também em suas Sub-Delegacias, conforme as peculiaridades da região e as dimensões territoriais, isso com o intuito de que os estudos e medidas do núcleo sejam efetivamente direcionados a realidade e as particularidades das comunidades onde efetivamente estão instalados, dada as diversidades regionais de um país como o Brasil.

Neste ponto do estudo acho por bem relembrar que tais medidas não são fruto da bondade de nossos dirigentes políticos e empresariado, mas exigência dos organismos internacionais, que por meio de seus instrumentos de adesão, obrigam os países signatários a adotarem medidas, em seu território, que viabilizem a execução dos planos a que se comprometeram. E que quem subscreve documento internacional (tratados e convenções) e não dá efetivo cumprimento a seus preceitos, sofre embargo internacional, inclusive econômico.

Exemplificando, para ficar mais claro: em meu Estado (Alagoas) as indústrias do setor sucroalcooleiro se esforçam bastante para não terem mais crianças trabalhando no corte da cana-de-açúcar. Assim, conquistam o selo Abrinq e tem as portas do mercado internacional abertas para o seu produto, já que suas empresas demonstram, com o selo, que estão cumprindo sua função social. Entenderam o “pulo do gato”?

De acordo com a RAIS – Relatório Anual de Informações Sociais –, no Brasil existem 31.979 estabelecimentos com mais de cem empregados. Se todos cumprissem a reserva legal, seriam gerados 559.511 postos de trabalho a serem ocupados pelas pessoas com deficiência. Lamentavelmente, número suficiente para empregar apenas 3,7% das 15,14 milhões em idade adequada e com condições para o trabalho. Portanto, necessário que a inserção da pessoa com deficiência no mercado de trabalho seja conseqüência natural da superação do preconceito e efetuada de forma natural, e não somente até que se atinja determinado percentual previsto em lei, que consoante demonstrado, não atenderá a todo o universo de pessoas especiais aptas ao trabalho.

Muitas pessoas com deficiência são friamente eliminadas da possibilidade de uma participação ativa na sociedade, em razão de obstáculos materiais que, à propósito, já deviam ter sido eliminados por força do disposto nos arts. 227, §2º, e 244, da CF/88, art. 2º, V, ‘a’, da Lei n.º 7.853, de 24/10/89, bem como a Lei n.º 10.098, de 19/12/2000, que trata especificamente da questão, estabelecendo normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência de mobilidade reduzida, determinando a supressão de barreiras e obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção, na reforma de edifícios, nos meios de transporte e de comunicação.

No ambiente de trabalho, através de uma aplicação mais ampla dos princípios ergonômicos, é possível a adaptação, a um custo reduzido, do local de trabalho, das ferramentas, do maquinário e do material, ajudando a aumentar as oportunidades de emprego para as pessoas com deficiência. Em outros casos, sequer isso é necessário, eis que essas pessoas se superam e desenvolvem formas diferenciadas de exercerem suas funções, sem necessidade alguma de modificação do posto de trabalho e sem que haja constatação de queda na produção.

Por fim, merece destaque a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, documento elaborado em agosto deste ano, em Nova Iorque, nas Nações Unidas, após cinco anos de negociações, entre 192 países (cerca de 200 representantes de delegações governamentais e 800 representantes de ONGs). Este é o primeiro tratado aprovado na área de direitos humanos do século XXI.

A convenção é composta de 42 artigos. Com exceção de um artigo, que foi a votação (o artigo sobre situações de risco. Dos 115 países presentes na hora da votação, 102 votaram a favor e 8 se abstiveram. Apenas 5 votaram contra) os demais foram fruto de negociação, o que demonstra a maturidade das civilizações em relação ao reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiência. Agora, o documento será revisto por juristas e traduzido nas línguas oficiais da ONU, para aprovação em Assembléia Geral e posterior ratificação pelos países.

Basicamente, não foram garantidos novos direitos, mas reafirmados e esmiuçados os já existentes. Foram estabelecidos três pilares fundamentais: 1) proibição de todo tipo de discriminação (direta e indireta); 2) adoção de políticas ativas (discriminação positiva); e, 3) participação das pessoas com deficiência (por meio de suas associações representativas), nos processos de definição, planejamento, execução, supervisão das políticas que lhe digam respeito.

Demais disso, dá destaque as seguintes questões: 1) garantia da capacidade legal à pessoa com deficiência (que se torne possível às pessoas com deficiência expressarem suas necessidades pessoalmente, e não fazê-lo por meio de curador); 2) proibição de tratamentos forçados, sendo considerada violência contra os direitos humanos das pessoas com deficiência os tratamentos, a administração de medicações e a submissão a esterilização sem o seu consentimento; 3) cronograma razoável para a superação das barreiras arquitetônicas; 4) educação inclusiva, com as necessárias mudanças no sistema educacional geral; 5) necessidade de visibilidade do indígena com deficiência (ou pessoas que vivem em zona rural ou lugar ermo); e, 6) o reconhecimento de que mulheres e crianças com deficiência enfrentam barreiras adicionais (discriminação múltipla, pois são mais vulneráveis a violência doméstica e às situações de risco).

Ah, meus queridos, eu estou fazendo o curso de LIBRAS, a Linguagem Brasileira de Sinais! Ao contrário do que parece, é muito fácil aprender. Diria, mesmo, divertido! As associações e entidades representativas de pessoas com deficiência, em geral, oferecem o curso gratuitamente. Se tiverem um tempinho, vale a pena, viu?

Algum de vocês já viu o hino nacional em linguagem de sinais? É lindo de arrepiar!!!

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