sábado, 10 de setembro de 2011

Quilombolas do Muquém (União dos Palmares - AL) paralisam rodovia estadual

É sempre chato se deparar com uma manifestação popular, bloqueando a rodovia, quando estamos em trânsito.

Mas, vocês já viram alguma manifestação feita dentro do povoado, na sede da associação, do sindicato, dentro dsa escola, ter repercussão e algum resultado?

Infelizmente, enquanto formos tratados como lixo, parece que só chamamos a atenção da sociedade e das autoridades quando incomodamos.

Coloque-se, então, o "lixo" nas ruas, que enquanto ele estiver "embaixo do tapete", nada se fará para resolver o seu caso.

Foi divulgado pelo Tribuna de União que Quilombolas do Muquém, que fica em União dos Palmares, foram às ruas reivindicar melhores condições de moradia, alimentação e acesso aos programas sociais. Ou seja, direitos postos pela Constituição a todos os brasileiros.

Pela notícia, não chegaram a 100, os manifestantes. Mas fizeram bastante barulho, nesta sexta-feira, 9, no trecho da AL-205 – no quilômetro três.

Os manifestantes atearam fogo em galhos de árvore e pneus e exigiram a presença de representantes dos governos estadual, municipal e federal para garantir que as reivindicações sejam atendidas.

A manifestação aconteceu nove dias após a nomeação de nova diretoria da Fundação Cultural Palmares em Alagoas, ligada ao Governo Federal, que desde o último dia 30 está sendo coordenada pela ex-vereadora e atual presidente do PT em União, Genisete de Lucena Sarmento.

Os quilombolas reivindicam a reativação do Programa do Leite e a ampliação das ações de segurança alimentar, com a distribuição de cestas básicas do Programa Brasil Quilombola.

Eles querem ainda a construção de 26 casas através do Programa de Combate à Doença de Chagas, cujos recursos já foram assegurados através da Funasa e agilidade na entrega das casas do Programa da Reconstrução – destinado a vítimas da enchente de junho do ano passado.

Vocês souberam que todos os quilombolas do Muquém tinha sido dada como desaparecida, quando das enchentes do ano passado, e o resgate só conseguiu localizá-los e chegar até eles 24h depois, encontrando toda a comunidade literalmente pendurada nos galhos de uma árvore? Mulheres, crianças de colo, idosos, todos rezando para a danada não cair. E graças aos Deuses, não caiu.

O povo do Muquém também ficou sem ter onde morar. E lá se vai mais de um ano da tragédia, sem que nada tenha sido feito até agora.

Em termos matemáticos, o Muquém vivia em situação de miséria, e conseguiu ficar pior, com as cheias. Nem sequer restabelecer a miséria onde viviam o poder público conseguiu ainda...

O bloqueio da rodovia já trouxe um grande transtorno para a região. Um grande congestionamento foi registrado no local. Policiais do Pelopes acompanharam a movimentação e os quilombolas afirmaram que apenas desbloqueiam a rodovia após a chegada de representantes dos governos.

Fui "fabricada" e criada em União dos Palmares. Só não nasci por lá, porque minha mãe - garota esperta - quando completava os 8 meses de gestação ia embora, como se diz no interior "de mala e cuia" para a capital de Alagoas, Maceió, com receio de precisar de procedimento cirúrgico ou outra espécie de atendimento que no interior não teria acesso.

Saí de União para estudar na capital aos 11 anos de idade. Foi precoce. Mas minha mãe sempre foi "modernosa" e colocou as três filhas para estudar na capital, morando sozinhas, numa época em que isso não existia, e muito embora contra a opinião do resto da família. Foi um fato decisivo para quem eu sou hoje. Obrigada, mamãe (risos).

Mas somente me desliguei de União dos Palmares quando já tinha uns 25 anos, quando minha família já não morava mais lá.

E tenho em minha lembranças o Muquém, quando passeávamos com nosso pai por regiões onde era necessário passar pelas imediações do povoado.

Há 30 anos atrás pobreza era outra coisa, bem mais digna do que a miséria e o abandono do que se vê hoje. Ainda assim, os moradores do povoado conseguiam ser os mais pobres dos pobres da cidade. E isso ficou em minha memória.

Nesse tempo eu não sabia que se tratavam de legítimos herdeiros do legado de Zumbi dos Palmares. Seria irônico, se não fosse um completo desrespeito, ser criado em terras de Palmares e sequer saber da existência dos quilombolas. Mas era isso que acontecia.

Um desrespeito com eles e comigo, que cresci na ignorância de minhas raízes, o que me afeta até hoje.

Nenhuma referência nas escolas. Passávamos por cima do assuntos muito mais levados a decorar o nome de Domingos Jorge Velho, como o homem que restabeleceu a ordem, mas se que fôssemos levados nenhuma vez a refletir sobre quem teria sido Zumbi e o que houve para que se formasse o Quilombo, que parecia ser sinônimo de rebeldia (no mau sentido) e baderna.
 
O povo do Muquém, para mim, naquela época, era silencioso e quieto. Mal levantavam a vista da porta de suas miseráveis casas.  Para mim, pareciam reservados.







E eu pouco sabia deles, a não ser que era o povo pobre que ficava no meio do caminho por onde eu precisava passar. 




Já adulta, me deparei com peças de barro do Povo do Muquém em algumas exposições promovidas pelo Sebrae em Alagoas, o que me deixou bastante satisfeita. Era o tal dos arranjos produtivos e da empreendedorismo chegando aos filhos de Quilombo.

Somente em 2007, cansada da minha ignorância e querendo respostas para as indaganções acumuladas em tantos anos de existência, é que comecei a estudar, de verdade, a presença negra no Estado de Alagoas. A história que se guardou embaixo do tapete. O que não está nos livros.




Embora trazendo transtornos a quem não pode, diretamente, solucionar os seus problemas, fiquei feliz - hoje sabendo quem são os Quilombolas do Muquém - de saber que eles levantaram o olhar para o horizonte e foram às ruas mostrar que existem e que são brasileiros. 

E como tal, detém cidadania e querem sua parte nesse grande bolo sobre o qual escorre cobertura do prato para quem quiser se deleitar. Basta que se dê acesso ao prato desta guloseima à TODOS.

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